A cadeia de custódia é o procedimento formal que garante a autenticidade e a integridade da prova digital desde sua coleta até a sua apresentação em juízo. No ambiente digital, onde dados podem ser facilmente manipulados, a rastreabilidade de cada etapa é essencial para assegurar a confiabilidade dos elementos probatórios. A ausência ou falha na documentação dessa sequência pode comprometer totalmente o valor jurídico da prova, abrindo margem para questionamentos de nulidade e impugnações com base técnica.
Nos tribunais, especialmente em processos que envolvem criminal compliance, direito penal ou empresarial, o controle rigoroso da cadeia de custódia é cada vez mais exigido por advogados que operam em contencioso estratégico. Fragilidades nesse processo podem se tornar a principal linha de defesa, não apenas anulando a prova, mas influenciando decisivamente o desfecho da causa.
Onde Ocorrem as Fragilidades Mais Comuns
As vulnerabilidades na cadeia de custódia digital podem surgir em diferentes momentos do ciclo probatório. Entre os pontos críticos, destacam-se:
- Coleta da prova: quando é feita por agentes não qualificados ou sem ferramentas forenses apropriadas, como Cellebrite ou UFED, os dados coletados podem ser contaminados ou perder metadados essenciais.
- Armazenamento: o uso de mídias não lacradas, ausência de hash de verificação ou armazenamento sem controle de acesso facilita adulterações.
- Transferência: movimentação de mídias sem registro de responsáveis ou troca entre dispositivos pode invalidar a rastreabilidade.
- Análise técnica: peritos sem credenciamento ou sem metodologia pericial transparente expõem o laudo a impugnações.
- Apresentação judicial: provas não autenticadas por certificação digital ou sem anexos demonstrativos da cadeia de custódia são frequentemente desconsideradas.
A parte atenta a essas fragilidades atuam de forma a questionar não o conteúdo, mas a forma com que ele foi produzido e inserido nos autos.
Impactos Jurídicos da Quebra da Cadeia de Custódia
A consequência mais grave da quebra de cadeia de custódia é a possível declaração de nulidade da prova. Juridicamente, isso se enquadra como prova ilícita, uma vez que não há garantias de que os dados não tenham sido manipulados. O artigo 157 do Código de Processo Penal é claro ao vedar o uso de provas obtidas por meios ilícitos, o que abre espaço para incidentes de falsidade, pedidos de desentranhamento e recursos que sustentam a violação do devido processo legal.
No cenário cível, especialmente em disputas societárias ou ações envolvendo compliance digital, a fragilidade da prova pode inverter o ônus da prova ou beneficiar a parte que demonstra irregularidade na produção dos dados. A jurisprudência tem evoluído no sentido de exigir documentação completa, desde a origem até a análise da evidência, com exigência de relatórios técnicos robustos.
A Atuação Do Assistente Técnico Diante Das Fragilidades
O assistente técnico representa um dos pilares da defesa estratégica em casos onde a cadeia de custódia é contestada. Cabe a esse profissional identificar lacunas nos registros, falhas metodológicas e incoerências nos laudos apresentados pela parte adversa ou por órgãos oficiais.
Sua atuação se torna ainda mais relevante quando o caso envolve ferramentas como Cellebrite, XRY ou AXIOM, cuja operação exige protocolos forenses rígidos. O assistente pode verificar se os procedimentos foram seguidos conforme manuais técnicos e normas internacionais, como as diretrizes da SWGDE ou do NIST.
Além disso, o parecer técnico pode ser decisivo para embasar impugnações, incidentes de falsidade ou pedidos de perícia complementar. Em causas de alto valor, essa análise pode transformar uma prova inicialmente robusta em um elemento inválido, com repercussões relevantes para a tese jurídica do cliente.
Conclusão: Como os Escritórios Devem Lidar Com Essa Questão
Para escritórios de advocacia é imperativo desenvolver um olhar técnico-jurídico sobre a cadeia de custódia digital. O entendimento profundo desse processo permite não apenas defender clientes, mas também formular estratégias ofensivas de impugnação. O investimento em parcerias com peritos judiciais especializados em provas digitais, além da formação interna de advogados com conhecimento técnico básico, torna-se uma vantagem competitiva. Ao identificar fragilidades na cadeia de custódia, esses profissionais não estão apenas apontando erros processuais, mas protegendo seus clientes de condenações baseadas em elementos questionáveis e conduzindo o processo para uma posição de maior domínio.